A visão é o sentido mais requisitado na vida contemporânea. Cerca de 80% de tudo que está à nossa volta é recebido pelos olhos, que enviam a informação ao cérebro para ser processada. Mas, bombardeados com imagens, símbolos e informações digitalizadas, eles andam sobrecarregados. Somam-se a isso os agentes agressores, que crescem com a poluição e a secura do ar. A visão, então, deveria receber tratamento vip. Não é o que acontece: 64 milhões de brasileiros nunca foram ao oftalmologista e 20 milhões estiveram ali uma única vez. Isso significa que quase metade da população (46%) não faz check-ups para prevenir doenças, segundo revelou uma pesquisa realizada no meio do ano pelo Ibope a pedido da Sociedade Brasileira de Glaucoma. O levantamento, que ouviu 2002 brasileiros, revelou que a desinformação é grande. Por exemplo: 40% das mulheres supõem que é possível voltar a enxergar após tratar o glaucoma. “Ele até pode ser controlado, mas a visão perdida não é mais recuperada. Daí a importância de detectar o problema o quanto antes”, diz o oftalmologista Vital Paulino, presidente da sociedade. Embora a hereditariedade tenha peso alto no aparecimento dos distúrbios, a recomendação dos especialistas é aprender a poupar os olhos, conhecendo melhor as ameaças para saber como se esquivar delas.
CVS
O nome completo, em inglês, é computer vision syndrome. Trata-se de um mal que ataca o usuário do computador, smartphone e tablet, provocando vermelhidão, ardor, fadiga ocular, coceira e dor de cabeça. Ainda deixa a imagem desfocada ou dupla. A culpa não é da tela. “Em atividades que exigem o foco para perto, piscamos 20% menos, e isso reduz a lubrificação do olho”, explica o oftalmologista Fernando Tarcha, da Faculdade de Medicina do ABC. Quem tem astigmatismo, miopia e hipermetropia sofre mais, pois faz esforço extra para enxergar. Se o grau dos óculos estiver inadequado, as dificuldades aumentam. Repouso e analgésico aliviam. Mas o melhor é prevenir: a cada hora de trabalho, é preciso dar uma parada, piscar, desviar da tela e mirar o infinito. O monitor deve ficar a uma distância de 50 a 65 centímetros do nariz e um pouco abaixo dos olhos. O médico pode indicar um colírio para lavar, nutrir e proteger.
Olho seco
O ar condicionado e a baixa umidade do ar agravam essa doença. “É caracterizada pela deficiência na produção de lágrimas e pode provocar lesão na córnea”, afirma o oftalmologista André Berger, de São Paulo. Afeta 30% da população e é mais comum a partir dos 40 anos, em mulheres na pós-menopausa e em quem toma diuréticos, antidepressivos e remédios para emagrecer. O sinal de alerta é a sensação de areia no olho e visão turva. Pode haver lacrimejamento: “É uma lágrima emergencial, como a do choro, sem os nutrientes para lubrificar os olhos”, diz o médico. O tratamento é feito com colírios lubrificantes e umidificadores de ambiente.
Conjuntivite alérgica
Cosméticos, poeira, fumaça e o cloro da piscina podem acarretar reações como coceira, vermelhidão, inchaço da pálpebra e sensibilidade à luz. Mais comuns em crianças com asma ou rinite, as alergias também se manifestam na vida adulta. “Há colírios antialérgicos eficazes, mas não devem ser usados por conta própria”, avisa o oftalmologista Edmundo Velasco Martinelli, diretor da Clínica Laser Ocular, em Santo André. Vale investigar o causador da crise. Se a suspeita recai sobre o rímel ou o creme da área dos olhos, por exemplo, suspenda o uso e avise o médico.
Glaucoma
É a principal causa de cegueira e aparece a partir dos 40 anos. No país, há 1 milhão de pessoas com glaucoma, mas apenas 50% estão em tratamento. Sem alarde, ele destrói as fibras do nervo óptico, que levam as informações visuais ao cérebro. Segundo Vital Paulino, a pressão alta no olho é fator de risco, apesar de não ser condição obrigatória; o quadro também se manifesta em pessoas com pressão intraocular normal. Exames periódicos de fundo de olho flagram os primeiros sinais. O controle é feito com colírios, laser e cirurgia.
Vista cansada
Após os 40 anos, quase 100% da população tem presbiopia, nome oficial desse problema. O músculo encarregado de contrair a lente do olho (cristalino) para focar objetos próximos perde a força, e fica difícil ver de perto. A mulher precisa de óculos de leitura antes do homem. Não é por causa de diferenças hormonais, como já se cogitou. A questão é anatômica: o braço mais curto não permite afastar muito o livro ou o tablet, concluiu um artigo recente da revista científica IOVS – Investigative Ophthalmology & Visual Science, que analisou nove estudos. Segundo o oftalmologista Eduardo de Lucca, do Instituto de Moléstias Oculares, em São Paulo, a correção é feita com óculos, lentes de contato ou intraoculares inseridas em cirurgia.
Catarata
No Brasil, a cada ano surgem 100 mil casos dessa doença, que, gradualmente, deixa o cristalino opaco e a visão embaçada. Embora seja comum em velhos, já há registros na faixa dos 50 anos. Técnicas cirúrgicas avançadas substituem o tecido danificado por uma lente intraocular sem a necessidade de esperar a catarata amadurecer. “A melhor hora de operar é quando começa a prejudicar as atividades”, afirma André Berger.
Degeneração da retina
“Afeta as células do meio da retina, levando à perda da visão central e da capacidade de ver detalhes, atrapalhando a leitura”, explica o médico Danilo Soriano, do Departamento de Oftalmologia do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo. A chamada degeneração macular da retina cresce com a idade. Mas após os 50 já dá para detectar pistas e iniciar tratamento para retardar o processo. Ler no avião não aumenta o risco, como se acredita.
Riscos paralelos
Diabetes, hipertensão arterial e tabagismo comprometem os nervos e os vasos que irrigam os olhos. Colírios adotados por conta própria também são um risco. Já uma dieta pobre em nutrientes deve ser incrementada com fontes de ômega 3 (salmão, sardinha) e antioxidantes (verduras verde-escuras, hortaliças, frutas de cores vivas). Para garantir boa visão, a Sociedade Brasileira de Oftalmologia Pediátrica recomenda o teste do olhinho na maternidade, que diagnostica doenças, tumores e inflamações no recém-nascido. Depois, até 2 anos, faz-se um exame completo (com dilatação da pupila) a cada seis meses. Se tudo estiver bem, as consultas passam a ser anuais pela vida toda.
Não basta ser fashion
Para regular a entrada de luz nos olhos, a pupila se contrai em ambientes iluminados e se dilata no escuro. Assim, quando usamos óculos de sol, ela tende a se dilatar. “Se as lentes não têm proteção contra raios ultravioleta (UV), os olhos ficarão muito mais expostos, o que pode causar catarata e danos à retina”, diz Liliane Ventura, coordenadora do Laboratório de Instrumentação Oftálmica da Escola de Engenharia da USP, em São Carlos (SP). Para avaliar a qualidade das lentes, a equipe dela criou o Self-Service, que mede a porcentagem dos raios filtrados e permite conferir para quais situações elas são mais adequadas – se para a praia com sol a pino ou para dirigir. A ideia é instalar um aparelho em cada campus da USP e, mais tarde, introduzi-lo no mercado – em lojas e consultórios – para que as pessoas possam checar seus óculos. Antes, isso era feito pelo espectrofotômetro, equipamento caro que raros médicos têm. Enquanto o Self-Service não chega, o mais seguro é comprar óculos com certificação, em óticas idôneas, e evitar os de camelô.
Fonte: Revista Cláudia