A construção civil e o desenvolvimento sustentável

Pesquisador da University of California, o engenheiro mecânico e administrador Wilmar Mattes fala sobre o papel da indústria da construção na realização dos objetivos globais da sustentabilidade

 

* Wilmar Mattes é doutor e mestre em Engenharia Mecânica, especialista em Gestão de Negócios Internacionais e graduado em Engenharia Mecânica e Administração, com ênfase em Comércio Exterior. É pesquisador da University of California (Los Angeles) desde 2008 e professor de engenharia no Centro Universitário Católica de Santa Catarina desde 2002.

 

Proma: Qual é o papel da construção civil para a realização dos objetivos globais do desenvolvimento sustentável?

Professor Dr. Wilmar Mattes: A indústria da construção é uma das atividades humanas que mais consome recursos naturais – estima-se, internacionalmente, que entre 40% e 75% dos recursos naturais existentes são consumidos por esse setor, resultando, assim, em uma enorme geração de resíduos. Só no Brasil, a construção gera 25% do total desses resíduos. É por isso que, segundo Green Domus, o setor da construção civil tem papel fundamental no desenvolvimento do país e, dessa forma, se torna peça chave para o atendimento dos objetivos globais do desenvolvimento sustentável. Nesse sentido, a adoção definitiva dos chamados prédios verdes – os empreendimentos sustentáveis na construção civil – teve um enorme sucesso de público e de rentabilidade. Na construção civil, os empreendimentos sustentáveis só recebem essa denominação se atenderem a seis regras básicas: 1. Sustentabilidade do canteiro de obras e da região em torno dele, inclusive com recuperação de todas as áreas que forem afetadas pela construção; 2. Eficiência total no consumo de água: reaproveitamento da água utilizada e aproveitamento da água da chuva; 3. Garantia da redução do consumo e da eficiência energética do prédio, inclusive com uso de fontes renováveis de energia; 4. Reciclagem e tratamento correto dos dejetos e resíduos; 5. Trabalhar para manter o mais baixo possível as emissões de poluentes e usar materiais de origem vegetal ou reciclados no acabamento ou infraestrutura; 6. Buscar sempre a melhoria e a adequação dos procedimentos. Na prática, construir de maneira sustentável significa:

  1. Reduzir o impacto negativo das obras (barulho, poeira e tarefas repetitivas);
  2. Integrar fontes de energia renováveis ainda no estágio de desenvolvimento do projeto;
  3. Usar materiais recicláveis na construção para preservar recursos naturais;
  4. Melhorar a performance térmica dos edifícios para reduzir os custos com ar-condicionado, calefação e as emissões de CO2;
  5. Projetar o tempo de vida das estruturas;
  6. Reciclar materiais e estruturas após a demolição;
  7. Conceber projetos habitacionais de baixo custo para melhorar as condições de vida da população de baixa renda.

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Proma: De acordo com o Ministério do Meio Ambiente, o Conselho Internacional da Construção (CIB) aponta a indústria da construção como o setor que mais consome recursos naturais, gerando, assim, consideráveis impactos ambientais. Como reverter essa situação?

Professor Dr. Wilmar Mattes: O setor da construção civil responde por 10% do PIB (Produto Interno Bruto) do mundo e emprega mais de 100 milhões de pessoas (28% da força de trabalho). O desenvolvimento sustentável busca integrar três grandes pilares: 1. A performance econômica; 2. As consequências sociais das ações de uma empresa (com relação aos seus empregados, fornecedores, clientes e comunidade local); 3. Os aspectos ambientais (alcançar um equilíbrio entre as atividades da empresa e a preservação do ecossistema). O que está acontecendo? Como a busca de sustentabilidade pode resultar no oposto? Deve-se buscar o conhecimento técnico. Exemplos:

  1. Para produzir 1000 ml de álcool combustível, se gasta 600 ml de óleo diesel. Agora, pensado no estado (país) é benéfico por não ficar dependente de países produtores de petróleo.
  2. A ponte Rio-Niterói trouxe grandes impactos iniciais, mas, com o passar do tempo, foi benéfico por encurtar o trajeto, economizando combustível nos meios de transportes.

Nesse sentido, um dos problemas das abordagens sustentáveis é não questionar a tipologia vigente. Ao invés disso, apenas são agregados componentes mais “ecológicos”, como sistemas e isolamentos mais eficientes. Mas, este conceito de sustentabilidade “agregada”, mesmo que tenha sucesso parcial, mantém formas e sistemas estruturais intocados. O resultado é, muitas vezes, um nivelamento dos ganhos com prejuízos imprevistos. Por exemplo, adicionar instalações elétricas mais eficientes reduz a energia usada e, assim, diminui o custo geral. Mas, custos menores tendem a diminuir a preocupação dos usuários com o desperdício – paradoxo estabelecido, em 1865, pelo economista inglês William Stanley Jevons. Aumentar a eficiência diminui o custo, o que aumenta a demanda, o consumo e elimina a economia inicial. A lição é que não podemos lidar com o consumo de energia isoladamente. É preciso olhar para o conceito de energia mais amplamente, incluindo a energia incorporada e outros fatores. A teoria da resiliência, discutida no artigo “Toward Resilient Architectures: Biology Lessons”, aponta para a natureza do problema. Sistemas podem parecer engenhosos dentro dos seus parâmetros pré-definidos, mas vão inevitavelmente interagir com muitos outros, geralmente de maneiras imprevisíveis e não lineares. É importante almejar uma metodologia de projeto mais “robusta”, combinando visões diversas e interligadas, funcionais em escalas diversas, garantindo a adaptabilidade dos elementos de projeto. Mesmo que estes critérios possam parecer abstratos, eles são exatamente as características alcançadas com os métodos ditos “passivos”. Edifícios passivos permitem ao usuário ajustar e adaptar as condições climáticas – por exemplo, abrindo ou fechando janelas ou anteparos e aproveitando luz e ventilação naturais. Esses projetos possuem: sistemas que desempenham mais de uma função – como as paredes, que constituem o prédio e também acumulam calor –, e espaços facilmente reconfiguráveis, mesmo para novos usos, sem grandes investimentos. São edifícios polivalentes não comprometidos com um visual popular ou um usuário específico. Para reverter esse cenário, a educação com conhecimentos técnicos é primordial. Quando pensamos em sustentabilidade e meio ambiente, sempre pagaremos um pedágio conforme exemplos citados a cima.

 

Proma: Os principais desafios para o setor da construção civil, ainda de acordo com o Ministério do Meio Ambiente, consistem na otimização do consumo de materiais e energia, na redução dos resíduos gerados, na preservação do ambiente natural e na melhoria da qualidade do ambiente construído. De que forma as construtoras podem alcançar esse desafio?

Professor Dr. Wilmar Mattes: Minha resposta é embasada com exemplos de algumas cidades sustentáveis pela Europa. A charmosa, elegante e ambientalmente correta Frieburg é uma delas – situada no sudoeste da Alemanha, o município de 200 mil habitantes fundado no século 12 é considerado o mais sustentável do mundo, pois investe em energia limpa. Com mais de 400 metros de equipamentos que produzem eletricidade com a luz do sol, Frieburg tem milhares de painéis solares instalados nas laterais dos edifícios e nos telhados das casas. A cidade sempre esteve na liderança do desenvolvimento de energia limpa, já que, por ano, são mais de 1.800 horas de sol brilhando em Frieburg (imagine o que poderíamos fazer no Brasil, um dos países mais ensolarados do mundo?). Nesse sentido, para mim, as construtoras devem: conhecer o ambiente onde o empreendimento será construído; compreender o custo da reciclagem ou uso dos materiais; prever quais serão os impactos no futuro; buscar construir em ambientes seguros; construir com técnicas de preços justos; construir para uma grande maioria da população; conhecer materiais que gastem menos energia para se produzir. Por fim, o mais importante é fomentar o negócio, onde uma grande parcela da população possa estar empregada, com moradia e bem estar, sem fatores de influência partidária e ideologias demagogas.

 

Proma: Na busca de minimizar os impactos ambientais provocados pela construção, surge o paradigma dos “empreendimentos verdes”. Como o senhor define uma construção sustentável?

Professor Dr. Wilmar Mattes: Os empreendimentos verdes são aqueles que respeitam o ambiente onde será construído, aplicam conceitos que possam usar os recursos naturais, como luz solar, água da chuva, luminosidade, ventilação, etc. Mas, acima de tudo, o mais importante é que uma grande maioria da população possa ter moradia – isto é consciência sustentável.

 

Proma: Quais são as energias alternativas que podem ser aplicadas na construção civil?

Professor Dr. Wilmar Mattes: Em um futuro próximo, toda a energia consumida por uma família em atividades cotidianas, como aquecer a água, usar eletrodomésticos e até mesmo recarregar um veículo elétrico, será fornecida pelo próprio edifício por meio de fontes renováveis. A afirmação é do engenheiro e professor da Escola de Projeto, Construção e Planejamento da Universidade da Flórida, Charles Kibert. Segundo o especialista, o “Santo Graal” para a sustentabilidade energética da construção civil são os chamados Edifícios de Energia Zero (zero energybuildings ou ZEBs, na sigla em inglês), que produzem mais energia do que consomem ao longo de um ano. Longe de um exercício de futurologia, os ZEBs já estão sendo incorporados na estratégia energética de diversos países no mundo, como Alemanha e Noruega e também nos Estados Unidos. Segundo Kibert, a Califórnia determinou recentemente que os edifícios residenciais tenham energia zero até 2020 e os comerciais até 2030. “Em um planeta em constante aquecimento, viver dentro do orçamento da energia produzida pela natureza será imperativo”, afirma. Acredito que, para a nossa região, o aconselhável é o uso de energia solar com placas fotovoltaicas.

 

Proma: Como o senhor avalia o modelo de construção adotado pela Proma?

Professor Dr. Wilmar Mattes: Em minha opinião, a construtora Proma está no caminho, pois demonstra por meio das suas ações e das construções dos empreendimentos que tem a preocupação com a responsabilidade social e o comprometimento do mercado com a sustentabilidade.

 


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